A prescrição, em síntese, é o instituto jurídico na “qual se dá a aquisição de um direito ou a liberação de uma obrigação, pela inação do titular do direito ou credor da obrigação, durante um lapso temporal previsto em lei”, conforme lição de MARIA HELANA DINIZ. Assim, o exercício de um direito em face de uma obrigação não pode se estender pela eternidade fixando a lei um período temporal em que titular deste direito deverá exercê-lo em face do devedor. Contudo, transcorrendo esse período o devedor da obrigação terá adquirido o direito da prescrição e estará liberado de sua obrigação original.

O prazo prescricional da obrigação decorrente do contrato de seguro é fixado pelo inciso II, do § 1º do artigo 206 do Código Civil determinando que prescreve em 1 ano “a pretensão do segurado contra o segurador, ou a deste contra aquele”. Assim, o lapso temporal em que as partes terão para discutir obrigações provenientes do contrato de seguro será ânuo e, especificamente quanto ao contrato de seguro de responsabilidade civil, a alínea “a” do inciso II determina que o início deste prazo, “para o segurado, no caso de seguro de responsabilidade civil, da data em que é citado para responder à ação de indenização proposta pelo terceiro prejudicado, ou da data que a este indeniza, coma a anuência do segurador.”

Em regra geral, temos que, no contrato de seguro de natureza de responsabilidade civil, o prazo prescricional ânuo para o segurado buscar direito em face da seguradora iniciará a partir da sua “citação” para responder à ação indenizatória proposta pelo terceiro prejudicado ou, ainda, a partir da data que o indeniza com a concordância da seguradora.

Contudo, o STJ deu interpretação ampla ao termo legal “da data em que é citado para responder à ação de indenização” a partir dos princípios da boa-fé objetiva e da própria função do contrato de seguro para entender como data início da prescrição em apólice de D&O a “primeira ciência do segurado acerca do processo judicial promovido pelo terceiro” e não necessariamente a sua citação, conforme voto da Min. Nancy Andrighi, no julgamento REsp n. 1.990.918-SP, em 17/10/2023.

Nessa linha de raciocínio, em que a pese a literalidade do art. 206, § 1º, II, “a”, do CC/2002 refira-se à “citação” do segurado para responder à “ação indenizatória” proposta pelo terceiro prejudicado – que corresponde à maioria das situações -, o nascimento da pretensão está atrelado à primeira ciência do segurado acerca do processo judicial promovido pelo terceiro prejudicado que busca responsabilizá-lo, independentemente  de diferenças meramente procedimentais que não interferem na finalidade da norma.”

No caso prático do referido julgado, o segurado foi incluído no processo na fase de execução por devedor solidário, ou seja, não existindo citação e a indenização já estava resolvida. Assim, fixou a Min. Nancy Andrighi:

Em síntese, em seguro de responsabilidade civil, quando o segurado não é citado na fase de conhecimento e passa a integrar o polo passivo de processo movido pelo terceiro prejudicado apenas na fase executiva (como por força de reconhecimento de grupo econômico em execução trabalhista ou desconsideração da personalidade jurídica), o início do prazo prescricional da sua pretensão contra o segurador é a data da sua intimação ou da ciência inequívoca dos autos, o que ocorrer primeiro, em observância à finalidade do art. 206, § 1º, II, “a”, do CC/2002."

A literalidade do Código Civil aos termos “citação” e “ação indenizatória” da alínea “a”, do inciso II, do § 1º do artigo 206 admite, segundo STJ, interpretação extensiva para reconhecimento do início do prazo prescricional a partir de outro ato processual formal e outra demanda, que não seja indenizatória, do segurado em face do segurador, em harmonia, segundo a Min. Nancy Andrighi com o direito de informação decorrente da boa-fé objetiva do § 1º do art. 787 também do Código Civil.

A previsão da citação como termo inicial do prazo prescricional pelo art. 206, § 1º, II, “a”, do CC/2002, justifica-se porque, em regra, é o ato processual por meio do qual o segurado toma ciência da existência do processo. A finalidade da norma, inclusive em harmonia com o art. 787 do CC/2002, é garantir que o segurador seja prontamente informado da ocorrência do fato ou, ao menos, de eventual processual judicial instaurado contra o segurador, para que possa, de forma ágil e tempestiva, adotar as medidas que entende cabíveis em sua defesa contra o terceiro prejudicado.”   

Diante disso, é importante que, independente, da natureza processual – intimação, citação, ofício – da ciência que o segurado em apólice de D&O tenha da pretensão do terceiro e independente da natureza do processo – indenizatória, investigação, execução, produção de provas – que haja comunicação imediata para a seguradora como forma de preservação do dever de informação como decorrente da boa-fé objetiva do art. 765 do Código Civil e impossibilitando qualquer interpretação ampliativa da regra da prescrição.

É fundamental que os segurados em apólice de responsabilidade e, especialmente D&O, tenham por certo que toda e qualquer ciência inequívoca da existência de processo de qualquer natureza promovido pelo terceiro deverá ser comunicado imediatamente à seguradora sob pena de início da vigência do prazo prescricional.

Base: REsp n. 1.990.918-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, j. 17/10/2023.

(22.04.204)