Por Fernando Tilger (*)

Em todo o mundo o principal papel do Corretor de Resseguro (ou Broker) é intermediar a transferência de parte dos riscos assumidos pelas Seguradoras aos Resseguradores. Para isso, os Brokers devem conhecer e ter relacionamento com os Resseguradores a ponto de encontrar os parceiros ideais que estejam dispostos a assumir tais riscos cedidos pelas Seguradoras. Este risco transferido pode variar de uma simples proporção de um risco individual ou de um portfólio da Seguradora, a uma sofisticada estrutura que protege o capital da Seguradora, reduzindo a sua probabilidade de ruína, seja pela ocorrência de uma catástrofe ou pelo conjunto de diversos eventos independentes que poderiam prejudicar a saúde financeira da Seguradora.

No período de pré-abertura do mercado de resseguro no Brasil e, nos primeiros anos pós abertura, os Brokers detinham, quase que exclusivamente, o conhecimento e o relacionamento com os mercados internacionais, tornando sua atuação fundamental para acessar esses mercados.

O papel do Broker era basicamente transacional, servindo de intermediário entre as Seguradoras e os Resseguradores, contando com toda a sua habilidade, conhecimento e poder de barganha para articular e conseguir os melhores termos e condições para seus clientes e, adicionalmente, a relevante assistência na recuperação dos sinistros.

Este papel é inerente à atividade ainda hoje, porém, além desta função, os Brokers começaram a assumir parte do trabalho operacional das áreas de resseguro das Seguradoras, que estavam em formação ou eram inexistentes, tais como: elaboração de borderôs trimestrais, auxílio na geração das informações necessárias para envio aos Resseguradores para análise dos contratos (perfis de risco, perfis de sinistros, triângulos de runoff, etc.) e apoio na elaboração de novos produtos.

Ao longo da última década, a maioria das Seguradoras investiram em estabelecer um corpo técnico capacitado e uma estrutura de pessoas organizadas para suprir tais demandas operacionais. Além disso, muitos Resseguradores abriram escritórios locais ou têm visitado regularmente as principais Cedentes do mercado diminuindo assim a distância entre eles. Com isso, fez-se necessária uma adaptação dos Brokers para continuarem agregando valor aos seus clientes. Uma das principais mudanças foi o desenvolvimento e a implementação de ferramentas de modelagem capazes de produzir cenários e avaliar os diversos indicadores de performance da Seguradora, por exemplo: custo upfront, baseado nas desk quotes de resseguros não-proporcionais (desk quotes podem ser definidas como os custos indicativos de resseguro ainda sem suporte do mercado de resseguro), impactos na redução da volatilidade, aumento da retenção de prêmio ou do resultado, aumento do retorno sobre o capital, alívio de capital, entre outros. Tais indicadores facilitam a tomada de decisão das Cedentes para determinar a estrutura de resseguro mais eficiente para atender às suas necessidades.

Com o advento da utilização dessas ferramentas de análise de cenários estocásticos (baseados na modelagem de distribuições de probabilidade de sinistros e simulações) e determinísticos (baseados em curvas pré-definidas de precificação) o approach aos Resseguradores para a colocação de alguns programas de resseguro se modificou de uma aproximação baseada em Price Discovery (que consiste no acesso aos potenciais Resseguradores líderes com o intuito de receber deles uma cotação competitiva para, então, buscar mercados followers para a integralização do negócio) para uma nova prática denominada Market Making, que parte da pró-atividade dos intermediários, em conjunto com seus clientes, em criar o racional por trás das estruturas selecionadas para a colocação e as premissas necessárias para garantir a geração de interesse dos Resseguradores em seguir os preços target modelados e estabelecidos nas desk quotes.

Partindo da premissa de que o mercado brasileiro tende a cada vez mais alinhar-se e ser influenciado pelas práticas do resto do mundo, qual seria então o novo papel dos Brokers no mercado Brasileiro?

Em termos de alocação de capital, por exemplo, os mercados mais maduros estão migrando de um modelo de fórmula padrão para modelos internos de alocação de capital baseado em risco, e, neste novo cenário, o tipo de resseguro que melhor se adequava a uma determinada necessidade da Seguradora se modifica, pois resseguros não–proporcionais e outras estruturas alternativas de transferência de risco que tinham baixo impacto nos modelos padrões, começam a produzir resultados melhores nos modelos internos e a um custo menor do que o dos resseguros proporcionais, ou seja, tornam-se mais eficientes e otimizam o retorno sobre o capital das Seguradoras. Em virtude disso, existe uma tendência mundial de associação e, até mesmo, fusões de Brokers com empresas de softwares e de consultoria especializada para atender a estas demandas cada vez mais latentes de encontrar as ferramentas ideais que atendam a estas novas realidades.

No Brasil, a SUSEP permite que, após a devida aprovação, a Seguradora utilize um modelo interno para cálculo dos Capitais de Risco, desde que tal modelo possua um nível de confiança de 99%, ou seja, uma probabilidade de ruína máxima de 1% e abranja todos os quatro riscos fundamentais: Subscrição, Operacional, Crédito e Mercado.

Em um cenário de queda de taxas de juros e diminuição de margens fica cada vez mais clara a necessidade de se otimizar o retorno sobre o capital e muitas Seguradoras estão avaliando o custo para aprovação destes modelos internos de capital de risco e os eventuais retornos proporcionados por estes novos modelos.

Neste contexto, os Brokers terão o papel fundamental de encontrar os parceiros ideais para atender às demandas de cada um de seus clientes, bem como de possuir o conhecimento e as ferramentas necessárias para desenhar e construir as melhores soluções e estudos imprescindíveis para a tomada de decisão da compra de uma estrutura alternativa de resseguro aderente a cada estratégia de alocação do capital.

Não restam dúvidas de que o papel do Broker continuará mudando ao longo dos próximos anos para um suporte cada vez mais consultivo baseado no seu conhecimento, suas análises e na apresentação de soluções sob medida para os clientes, não deixando de manter o seu princípio transacional e de relacionamento com o mercado, mas com uma abordagem mais técnica e alinhada ao desenvolvimento de novas tecnologias e realidades dos atuais compradores de resseguro.

(*) Fernando Tilger é formado em Matemática e Atuária pela Universidade de São Paulo com MBA em Gestão de Seguros e Resseguros e diversos cursos com ênfase na precificação e elaboração de contratos de resseguro; possui mais de 15 anos de experiência no mercado de seguro brasileiro tendo atuado em diversas áreas na Tokio Marine, no IRB-Brasil Re em São Paulo onde era responsável pela análise e precificação dos contratos de resseguro e, atualmente, é gerente de contratos de resseguro da Willis Re Brasil. Também faz parte do corpo docente da Funenseg nas disciplinas relacionadas à modelagem, estruturação e gestão e Programas de Resseguro nos Cursos de Resseguro Avançado e do MBA de Seguros e Resseguros.

(26.01.2018)