Por Antonio Penteado Mendonça

Antonio-Penteado-MendoncaUm dos requisitos básicos para a contratação de uma apólice de seguros, de acordo com o Código Civil, é o legítimo interesse do segurado sobre pessoa ou coisa a ser protegida.

Por esta razão, no Brasil, não é legalmente permitida a contratação de seguro para proteger bem ou direito ilegal ou sobre o qual o segurado não tenha interesse. Ao colidir com a lei, o interesse do segurado deixa de ser legítimo, o que automaticamente veda a contratação do seguro pela afronta ao dispositivo legal. Da mesma forma, se o segurado não tiver interesse direto sobre o bem ou pessoa, ele também não pode contratar apólice em seu favor.

A regra prevalece não apenas no Brasil, ela é válida e tida como fundamental em todos os países desenvolvidos. Se o interesse do segurado não é legítimo, ou seja, se seu direito não é bom, a seguradora não pode aceitar o risco.

Não é por outra razão que o Código Civil determina que a contratação do seguro seja precedida do envio à seguradora de proposta de seguro especificando o interesse a ser garantido e o risco.

Caso o segurado deixe de informar ou informe incorretamente sobre o risco que pretende segurar, de forma a levar a seguradora a erro na aceitação do seguro, ele perde o direito à indenização e a seguradora mantém o direito ao prêmio.

Para facilitar o entendimento, um bom exemplo de falta de interesse no seguro é alguém pretender contratar um seguro de vida, colocando a si mesmo como beneficiário da indenização, em nome de uma pessoa à beira da morte, sem qualquer vínculo com ela.

Neste caso, a indenização não poderia ser paga diante da evidente falta de justificativa para a contratação da apólice, inclusive feita à revelia do segurado. A contratação de um seguro de vida em nome de uma pessoa à beira da morte, sem qualquer vínculo com o contratante, que também é o beneficiário do seguro, não pode ser feita porque a lei assim o determina.

Da mesma forma que não é factível a contratação de um seguro de veículo para um bem que não pertence, não está na posse, nem interfere na vida econômica do pretenso segurado. Sem interesse direto ou indireto do segurado no seguro do veículo a seguradora não pode aceitar o risco.

Mas há outra regra também prevista na lei que complementa e reforça as vedações discutidas até agora. De acordo com o artigo 762 do Código Civil, o contrato de seguro para garantir risco proveniente de ato doloso é nulo. Quer dizer, nestas situações não se discute a negativa da indenização porque o contrato não gera efeitos jurídicos. Ele, aos olhos da lei, simplesmente não existe.

É neste cenário que devemos analisar a eficácia de um contrato de seguro de transporte rodoviário de carga para um lote de armas contrabandeadas ou de cocaína, maconha, outra droga proibida, mercadorias roubadas, etc.

A resposta evidente para o caso é que não é possível a contratação de seguro para proteger a operação de transporte desses bens. Sendo bens ilegais, a operação de transporte também é ilegal.

No caso aplica-se indistintamente quaisquer das razões acima individualmente ou em conjunto para caracterizar a impossibilidade da contratação do seguro.

A lei determina que são seguráveis os interesses legítimos do segurado. Ora, a distribuição de drogas, o contrabando de armas ou a venda de produtos roubados são atividade criminosas, tipificadas no Código Penal, vale dizer, são operações absolutamente ilegais, que descaracterizam o legítimo interesse do segurado sobre os bens que se pretende segurar.

Como se não bastasse, o contrabando de armas, o tráfico de drogas e a venda de mercadorias roubadas são atos dolosos, ou crimes, o que faz que, ainda que aconteça a contratação de uma apólice de seguros para garantir os riscos do transporte, este contrato seja nulo, ou seja, não gere efeitos jurídicos em função da disposição legal pertinente.

Assim, ainda que alguém consiga contratar um seguro de transporte de carga para mercadorias ilegais ou fruto de crime, este contrato é nulo. Portanto, não gera nenhum efeito, tanto no pagamento do prêmio, como na obrigação do pagamento da indenização.

Fonte: SindSegSP, em 01.11.2018.